A duplicação de apenas 113 quilômetros da BR-364, entre os estados de Rondônia e Acre, virou bandeira política quase exclusiva do senador Confúcio Moura (MDB-RO). Em discursos, entrevistas e articulações em Brasília, o parlamentar tem se posicionado como o único defensor visível da medida. Mas até que ponto essa proposta representa um avanço significativo para a infraestrutura da região Norte? E mais: será que a solução apresentada é suficiente diante do tamanho dos desafios que a rodovia impõe à população?
A BR-364 é a espinha dorsal da ligação rodoviária entre o Acre e o restante do país. Com mais de 4.000 km de extensão, ela corta estados fundamentais como Rondônia, Mato Grosso e Goiás. No trecho entre Porto Velho (RO) e Rio Branco (AC), são cerca de 700 km, com pontos críticos de tráfego, acidentes e degradação constante do asfalto. O trecho sofre com alagamentos sazonais, buracos recorrentes e uma infraestrutura que não acompanha o crescimento da demanda logística da Amazônia.
Diante de tamanha complexidade, soa inusitado que a solução defendida pelo senador Confúcio Moura se restrinja à duplicação de apenas 113km — um projeto localizado, sem clareza sobre quais segmentos seriam contemplados e sem estudo técnico divulgado publicamente que justifique o impacto dessa intervenção limitada.
Segundo o próprio Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT), a manutenção de trechos básicos da rodovia já enfrenta dificuldades orçamentárias. Técnicos do órgão têm alertado que, sem um plano integrado de recuperação total, a duplicação de um trecho isolado pode ser insuficiente e até contraproducente. “Duplicar 113 km de uma rodovia com 700 km de problemas é como trocar o para-brisa de um carro com o motor fundido”, afirma um engenheiro rodoviário consultado pela reportagem, que pediu anonimato.
Além disso, não há consenso político nem técnico em torno da duplicação parcial. Outros representantes da bancada federal de Rondônia e Acre evitam abraçar a pauta, talvez por considerá-la de efeito limitado ou por priorizarem outros investimentos logísticos mais urgentes, como pontes permanentes, revitalização total da malha e integração fluvial.
O posicionamento isolado do senador Confúcio levanta dúvidas sobre a real motivação da proposta. Estaria a duplicação restrita a áreas de interesse político? Quais comunidades seriam beneficiadas ou prejudicadas pela intervenção pontual? Sem transparência nos estudos e sem articulação ampla, o projeto corre o risco de se tornar mais uma obra de vitrine do que uma resposta concreta à necessidade regional.
Para a população rondoniense e acreana, que depende diariamente da BR-364 para o transporte de alimentos, insumos médicos, combustíveis e outros bens essenciais, o debate precisa ser ampliado e aprofundado. A duplicação — se for necessária — deve vir acompanhada de um plano de mobilidade robusto, sustentável e que envolva múltiplas vozes, não apenas a de um senador em atuação solitária.
Ao fim, o que se espera não é apenas asfalto novo em 100 km, mas soluções reais para milhares de vidas que trafegam pela BR-364 e enfrentam, há décadas, o descaso com a infraestrutura da Amazônia.
Como pode um político ser contra toda sociedade organizada do seu estado?
Por Moisés Cruz – Jornalista